O chef mexicano Ernesto Martinez prepara taco apimentado recheado com insetos
Já se sabe que a alimentação à base de insetos poderá se popularizar ao
longo das próximas décadas. A Organização das Nações Unidas para a
Alimentação e a Agricultura (FAO) se pronunciou a favor do
desenvolvimento da criação de insetos em grande escala para conseguir
alimentar os mais de 9 bilhões de seres humanos que haverá até 2030.
Dois bilhões de pessoas já os consomem, especialmente na África, na
Ásia e até na América Latina. Na Europa há cada vez mais restaurantes,
empresas e até supermercados entrando nesse mercado em expansão. Mas que
riscos corremos ao consumi-los? É a essa pergunta que um parecer da
Agência Nacional de Segurança Alimentar (Anses), publicado na
quinta-feira (9), procura responder.
Esse estudo, iniciado no
final de 2013, consistiu em fazer um levantamento dos conhecimentos
científicos sobre o assunto, realizado junto com a unidade de
entomologia funcional e evolutiva da Universidade de Liège na Bélgica, e
depois em realizar uma análise aprofundada junto a um coletivo de
especialistas em biologia, química, alimentação animal e alergias.
Alergias
Resultado: o consumo de insetos, tanto na alimentação humana quanto na
animal, apresenta diferentes riscos. Eles são de ordem química (venenos,
resíduos de pesticidas, de antibióticos ou de poluentes orgânicos),
biológica (parasitas, vírus, bactérias), física (partes duras do inseto
como o ferrão e o rostro) e sobretudo alergênica.
Proteínas responsáveis
por alergias, como a miosina ou a quitina, que são encontradas nos
ácaros, crustáceos e moluscos, também estão presentes nos insetos
estudados. Por fim, segundo o relatório, os riscos residem nas
"condições de criação e de produção, para os quais conviria definir uma
regulamentação específica que permita garantir o controle dos riscos
sanitários."
"Esses riscos são os mesmos que para outros
alimentos mais comuns, como a carne. Mas seus efeitos concretos sobre o
homem e sua extensão, como as alergias cruzadas, não são conhecidos",
explica Stéphane Larreché, responsável pela avaliação dos riscos
biológicos dos alimentos na Anses. "Então é preciso conduzir pesquisas
complementares, tendo como foco insetos que possam ser criados em larga
escala."
Limites dos conhecimentos
Isso porque o parecer da Anses, para além dos riscos em potencial,
aponta sobretudo para os limites dos conhecimentos e da regulamentação
em matéria de consumo de insetos. "Os estudos científicos que existem
dizem respeito a somente uma dezena de espécies, como os gafanhotos, os
carunchos ou as moscas domésticas. Só que estima-se que entre 2.000 e
2.500 insetos diferentes sejam consumidos em todo o mundo", diz Stéphane
Larreché.
A Anses recomenda que essas pesquisas aprofundadas
permitam estabelecer uma lista das diferentes espécies e estágios de
desenvolvimento de insetos que possam ou não ser consumidos na União
Europeia. No final de 2013, a Agência Federal para Segurança da Cadeia
Alimentar belga havia levantado essa lista, contendo dez espécies que
podem ser comercializadas, mas nada parecido existe para toda a Europa.
Lacuna jurídica
Isso porque embora os insetos já acabem – de maneira secundária – nos
pratos dos consumidores há alguns anos em Bruxelas, assim como em
Amsterdã, Londres, Berlim, Copenhague e Paris, eles não são oficialmente
autorizados na UE.
O regulamento europeu Novel Food, que se
aplica à alimentação humana, prevê que os novos alimentos devem ser alvo
de uma avaliação dos Estados-membros e da Autoridade Europeia de
Segurança Alimentar, antes de receberem uma autorização de
comercialização concedida pela Comissão Europeia, a menos que consiga
justificar um consumo significativo antes de 1997 na Europa, o que lhes
permitiria ser introduzidos diretamente no mercado.
Mas até hoje
nenhum consumo significativo de insetos pôde ser provado formalmente na
União Europeia e nenhum pedido de autorização para comercialização foi
recebido, nem concedido. Logo, nenhuma espécie está autorizada a entrar
no mercado europeu. Mas seu consumo na verdade é tolerado.
"Existem
ambiguidades sobre certos termos do regulamento europeu, sobretudo o
fato de que ele só diz respeito aos "fragmentos de animais". Algumas
indústrias consideraram que os insetos inteiros não eram cobertos pelo
texto, e as autoridades não têm um regulamento claro sobre o qual se
basear para sancionar", conta Stéphane Larreché.
O regulamento
europeu está em processo de revisão, uma vez que uma nova versão é
esperada para 2016. "Enquanto não são criadas normas específicas e uma
regulamentação adaptada", conclui o relatório, "a Anses recomenda
cautela aos consumidores que apresentem predisposições a alergias."

