Os policiais foram autuados por tortura e fato gerou conflito na
cúpula da SSPDS que teria percebido que denúncia era estratégia de
bandidos

Os quatro garotos disseram que escreveram o nome da facção por brincadeira. (Foto: Reprodução/TV Jangadeiro)
A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) precisou
intervir em impasse entre policiais militares e Controladoria Geral de
Disciplina dos Órgãos da Segurança Pública (CGD) na sexta-feira (2). O
fato aconteceu após quatro soldados responsáveis pela apreensão de
garotos que teriam desenhado nome de facção na calçada do 22° Batalhão da Polícia Militar, serem detidos, acusados de tortura.
Ontem, a Polícia identificou e apreendeu quatro adolescentes, com
idade entre 11 e 14 anos, que teriam desenhado, na calçada do batalhão, a
sigla de uma facção criminosa. Segundo os garotos, que estavam
acompanhados pelos pais e o Conselho Tutelar, o ato foi uma “brincadeira”, da qual estavam “arrependidos”.
O problema foi que os policiais, que iam fazer a condução dos
envolvidos à Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA), tinham
notificação para comparecer à CGD com hora marcada. Diante disso, o
comandante da 3a Cia do 22° BPM, major Hideraldo Bellini, autorizou que
os PMs fossem ao órgão e voltassem para conduzir os jovens.
Ao chegarem à CGD, foram informados de que um homem, supostamente ligado ao tráfico de drogas na comunidade do Pau Finim,
no Papicu, estava os denunciando por agressão aos garotos. Os policiais
e a viatura em que trabalham tiveram de passar por vistoria, na qual
foi encontrada uma pequena quantidade de drogas. Segundo os PMs, ela
ainda seria apresentada à delegacia, resultado das diligências que
estavam realizando na comunidade nas últimas 24 horas para identificar
os autores da afronta.
Ao ser acusado, um dos PMs teria se exaltado e discutido com o
denunciante e uma delegada. Os soldados acabaram recebendo voz de prisão
e foram autuados em flagrante por crime de tortura. O fato gerou
revolta no comandante do Batalhão que desabafou sobre o caso, em
entrevista à repórter Emanuella Braga, do Barra Pesada/TV Jangadeiro.
“Pedi às mães que aguardassem os policias deporem para que, no
retorno, a gente fosse à delegacia. Quando os policiais chegaram para
serem ouvidos de outro procedimento, tinha um traficante do Pau Finim, e
os policiais foram informados de que tinha uma pessoa os denunciando”,
pontuou Bellini. “Quatro pais de família foram autuados por tortura de
um integrante do tráfico de drogas. Não tem nenhum menino desses com um
arranhão, nem um ‘carão’ foi dado”, afirmou.
O comandante ainda criticou a ausência de suporte do Estado aos
policiais que “não ganham bem” e não têm estrutura adequada de trabalho.
“Depois de quase 48 horas de expediente, vejo meus policias presos na
CGD e me pergunto: “onde a gente vai parar, qual estímulo vou dar aos
meus policiais?’. Policial não tem que está baixando cabeça pra bandido
na frente de policial”, enfatizou.
O caso teria gerado contratempo na cúpula da Segurança Pública do
Estado – diante dos últimos casos de violência no Ceará. Os policiais
foram liberados horas depois, e o flagrante não foi efetivado. A
investigação segue por portaria.
Segundo Bellini, em entrevista ao Tribuna do Ceará
neste sábado (3), os órgãos da Segurança chegaram a um consenso de que o
suposto denunciante tinha como objetivo tirar os policiais do trabalho
nas ruas. Ele afirmou também que o secretário da SSPDS, André Costa, deu
todo apoio aos policiais e suporte jurídico.
A CGD confirmou que o flagrante não foi efetivado diante da necessidade de provas da acusação, e os policiais foram liberados.
“Brincadeira”
O caso teve início na quinta-feira (1°) quando o nome de um facção
amanheceu escrito com pedras de calçamento na calçada do Batalhão,
indicando possível afronta do grupo de criminosos. Desde então a Polícia
reforçou a busca pelos autores do crime.
No Batalhão, um dos garotos contou à reportagem que eles decidiram
fazer a “brincadeira” enquanto estavam jogando bola. Eles pediram
desculpa aos policiais e afirmaram não ter nenhum envolvimento com
facção criminosa.
A avó de um deles confirmou que foram as famílias que levaram os
adolescentes até a delegacia após eles confessarem o ato, com
acompanhamento do Conselho Tutelar.
O conselheiro Marcelo Lemos, que acompanhou o caso na delegacia,
pontuou que foram bem atendidos e perceberam que não houve nenhum
tratamento inadequado aos garotos e às famílias.
“Como se tratava de um crime numa área militar da gente, uma afronta a
um batalhão, pedi que diligenciassem ininterruptamente. Houve
contratempo, mas, com pouco tempo, foram identificados, e pedimos às
famílias que trouxessem os jovens. Para minha surpresa, tem jovem de 11
anos. Nem sabem o que é facção. Na minha época, a briga era (pelos
times) Fortaleza e Ceará. Hoje, você pergunta se ele fez a Crisma, o
Catecismo, ele não sabe nem o que é isso”, desabafou o major.
Fonte: Tribuna do Ceará